sexta-feira, 21 de outubro de 2016

ORGULHOSAMENTE RENASCE A POLITICA ESTUDANTIL. AGORA BEM MAIS ARMADA DA INTERNET

Diante de tudo que estamos vivendo atualmente no Brasil depois do Golpe de Estado de 2016, a força estudantil é prioritária para derrubar esse governo ilegítimo. Nos anos 60 e 70, a história mostra o quanto valeu a garra dos secundaristas e universitários, todos coordenados pela UNE.
Os estudantes com muita raça deixaram os generais e os golpistas encurralados. Nossas armas eram panfletos, os discursos inflamados e a mobilização das grandes passeatas.

O importante era retomar o pais das mãos da direita selvagem que destruía o Brasil e restabelecer a democracia. Naquela época, não havia muita facilidade de comunicação. Poucos possuíam telefone em suas casas nem era possível sonhar com os benefícios das redes sociais.
Hoje com mais de 60 anos, lembro com orgulho a minha contribuição para derrubar a ditadura. Vale a pena contar. Talvez, essa leitura seja do interesse de muita gente.

MOTIVAÇÃO E IDEOLOGIA

No final do mês de outubro de 1967, acabávamos de tomar posse como a diretoria eleita do Grêmio Olavo Bilac, no Colégio Estadual Edgard Santos, quando a greve geral dos estudantes foi decretada pela UNE.  Era um desafio muito nítido ao governo.
Mobilizamos o colégio e conseguimos uma adesão de quase 100% do turno matutino e vespertino, o noturno era mais complicado. Muitos trabalhavam durante o dia.
Pela primeira vez a farda do Edgard Santos se misturava na grande passeata que partiu do Campo Grande em direção a Praça da Sé onde as grandes lideranças fariam discursos incendiários.
Estávamos excitados e ao mesmo tempo amedrontados. Um calafrio percorria nossos corpos a cada minuto. Naquele momento, havia na mente apenas o desejo de protestar, não sentíamos o perigo a nossa volta na dimensão real. Éramos extremamente corajosos, jovens e inconsequentes.
Fomos informados que devíamos seguir pelo corredor da Vitória até o restaurante Universitário, onde algumas lideranças se aglomeravam e juntos, protestariam contra o fechamento do restaurante estudantil. Seguimos aquela indicação como uma massa de pessoas que já nem pensa. Estávamos prontos para a batalha em qualquer lugar.
Nos discursos inflamados de algumas lideranças Universitárias, fomos informados da impossibilidade do grande final ser na Praça da Sé. Seguimos em frente. A polícia estava bloqueando a Rua da Ajuda e Rua Chile. O grande comício estava sendo transferido para o terminal da Barroquinha. A passeata foi iniciada com as palavras de ordem “Abaixo a Ditadura” e “O povo unido jamais será vencido”.
Foi emocionante. Boa parte das pessoas que encontrávamos pelo caminho, aplaudia demonstrando apoio. Alguns até se juntavam a nós e outros ficavam apenas olhando enquanto muitos se escondiam. Logo depois do Relógio de São Pedro, escutamos o ruído dos cascos de cavalos. Era a policia que se aproximava lentamente. Eles estavam chegando de maneira ameaçadora. Cavalgavam no sentido contrário.
O confronto estava muito próximo, mas inesperadamente, vários estudantes jogaram bolinhas de gude na rua e os cavalos começaram a cair derrubando os soldados.  Um deles ao levantar, atirou para o alto e outro mirou nos estudantes que rapidamente se jogaram no chão sobre o passeio ao lado do mosteiro de São Bento. Foi uma rajada rápida e por sorte apenas na direção da parede. Os farelos do reboco caíram sobre nossas cabeças.
Com o tempo, ficamos mais velhos e prudentes. Não acredito que numa situação como a que foi narrada anteriormente, eu fosse agir da mesma maneira impetuosa e sem planejamento como aos 14 anos. No entanto, admito que ainda arda em mim, uma lembrança da chama do guerrilheiro sonhador e completamente dedicado ao que acredita e tem como inegociável na sua conduta ideológica.
Por algum tempo, mantive meu envolvimento estudantil numa atividade que variava de acordo com as oportunidades. No entanto, ao que me parece, ser fiel a uma ideologia não é coisa muito fácil. Algumas vezes me sinto um completo “OTÁRIO”. Essa sensação não dura muito, me sinto apenas HONESTO. Onde estavam os incendiários lideres do movimento estudantil depois de alguns anos?
Não julguem, apenas entendam. Quase todos eles foram cuidar da própria vida. Por serem oriundos de famílias tradicionais ou abastadas, muitos se tornaram homens de negocio. Alguns se candidataram a cargos no legislativo e foram eleitos, logo depois eles foram se revelando. Passaram a defender tudo aquilo que antes rejeitavam nos seus discursos.
Existe uma explicação para essa reviravolta ideológica?
Acredito que tudo isso é possível ser entendido quando pensamos na maneira que eles surgiram como lideranças. O movimento na época era abandonado pelos partidos que não injetavam um conhecimento teórico para a juventude. Algumas dessas lideranças, na verdade, eram pessoas insufladas pela própria ditadura para agitarem as massas e em seguida assumirem o controle evitando desdobramentos indesejáveis e revolucionários.
Mesmo diante desse equivoco ideológico, não desmerecemos a importância inesperada que os discursos produziram. Muitos que apenas escutavam passaram a ter um motivo para se aprofundarem nos estudos teóricos e decidirem ideologicamente pelo socialismo. Isso não era um efeito que os militares acreditavam se tornar possível.
A militância estudantil nas escolas é bem diferente do que ocorre nas universidades, mais pura e trôpega. No entanto, ainda é uma fonte de águas límpidas onde se pode saciar a sede sem medo de contaminações. Manter essa fonte sempre limpa, embora oferecendo espaço para que muitos se aproximem dela, buscando corretamente o aprendizado. Devemos encarar essa oportunidade como a mais segura e verdadeira maneira de criar a liderança autentica e estimular a militância ideológica.
Lamento muito que os partidos de esquerda nem de direita, não tenham um olhar atencioso para esse lado, ela nem sempre é levada muito a serio.
Como surgem essas lideranças? O que eles almejam?
Quase sempre são crianças que nem imaginam por onde seguirão. Aparecem como se fossem sugados por uma força invisível da necessidade do momento. São envolvidas por grupos de amigos que geralmente também nem sabem ao certo onde estão entrando. Os motivos são inúmeros, por ser um jovem bonito que faz sucesso com as meninas, um pensador prudente que encontra soluções ou até mesmo por ser apenas amigo de todos.
Eles ainda não projetam sonhos, mas eles são mordidos pelo bicho chamado poder e alguns entendem logo o que isso significa. Poucos são os que prosseguem nessa jornada de maneira consciente e desejada. São assustados pelos mecanismos do medo, que seus familiares herdaram.
Lembro bem do escutei ao ser eleito para a diretoria do grêmio Olavo Bilac. Minha mãe muito seria se mostrou preocupada.
- Você não devia se meter com essas coisas! Pode ser preso!
- Tenho de lutar para ajudar a derrubar essa ditadura! - Respondi vaidoso.
- Política é coisa ruim, todo mundo é ladrão ou acaba muito mal! – Ela lamentou me prevenindo. – Lembre-se que seu tio foi um dos que acabaram mal!

Assim, quase todos os que se arriscam na militância, mesmo que seja apenas participativa durante um movimento especifico, ainda hoje, escutam a mesma coisa. O que fez com que as pessoas passassem a se esquivar ou temessem tanto o envolvimento político?

MEDO HISTÓRICO

Para nossa sorte, a elite dominante no Brasil não é criativa. Até hoje faz o mesmo jogo para intimidar pessoas comuns de se aproximarem do poder, de protestarem contra as imposições sociais e políticas  que só aos ricos e poderosos interessam. Eles querem o povo ignorante e fácil de iludir.
Existe um fato narrado sobre um jantar muito elegante num palacete em Petrópolis onde o Imperador Pedro II estava presente. Dizem que um barão ou qualquer coisa assim se aproximou e ao escutar Pedro falar com entusiasmo sobre os seus planos culturais se mostrou preocupado.
- Queira me perdoar por discordar desses projetos. São perigosos!
- Não acredito nisso! – Disse o Imperador. – Onde está o perigo?
- Se esse povo aprende a ler, fica sabendo mais do que precisa, logo, até vão acreditar que podem ser deputados ou até mesmo Imperadores.
- Talvez deputados! – disse Pedro II. – Não se descuide, mas, Imperadores..., jamais!
Pouco tempo depois dessa conversa, aconteceu o golpe militar que proclamou a republica. Basta lembrar que esse pensamento do tal conde ou barão, foi mantido e hoje o PT incomoda muito. Foi eleito um presidente vindo do povo.
Naquela época, como agora, o método era o mesmo. Isso ocorreu durante toda a existência da política brasileira. Eles mantinham ideologicamente a ignorância do povo. Faziam terror jornalístico em forma de boatos de falcatruas e algumas vezes deixavam passar para  publicação. Assim ganhavam duas vezes, destruíam opositores ou rivais e ainda de quebra, afastavam deles o povo que apenas sacudia a cabeça concordando com tudo que não entendiam.
A imprensa sempre esteve nas mãos da elite dominante embora nem sempre escrita por eles, por isso mesmo, o povo se iludia. Quando o jornal falava, a verdade estava ali consignada para sempre. Um desmentido, nem era notado já que a sua publicação não produzia efeito, sem alarde e sem um destaque com a mesma importância da denuncia.
O povo, com a sua honestidade latente, ficava indignado e torcia o nariz. Na outra ponta dessa honestidade havia o interesse pessoal e quase todo mundo queria se aproveitar dos políticos para tentar lamber um pouco dessa gosma nojenta e lucrativa que os enriquecia. Vendiam suas almas sem qualquer constrangimento.
“Todo mundo rouba!” diziam quando eram cobrados pelos que não concordavam com esse ato aproveitador ou não foram chamados para participarem.
Dessa maneira, ficava muito difícil ser honesto de verdade. Só por uma defesa ideológica, os chamados de “Otários” se mantinham longe dessa tentação. Mudou alguma coisa? O que acontece nos dias de hoje?

#FORATEMER!

Um comentário:

  1. Gostaria de parabenizar o Farias pelo o belíssimo artigo.
    É uma verdadeira síntese de nossa história política recente, dotando de informações pertinentes ao embate do dia a dia, e nos mostrando as armadilhas que surgem ao longo da caminhada.

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