segunda-feira, 24 de outubro de 2016

A MÍDIA DE HOJE É UM ARREMEDO VERGONHOSO. NO ENTANTO JÁ EXISTIU UMA IMPRENSA DE VERDADE.

O silencio sobre as invasões estudantis nos noticiários é uma afronta a inteligencia dos brasileiros. É lamentável não termos uma imprensa decente.
O preço para manter uma imprensa livre é muito alto. Não se sustenta. Fica quase sempre impossível sobrepor o controle capitalista. Um jornal, uma TV, uma emissora de rádio, tudo é financiado pelos donos do dinheiro, os empresários golpistas, que investem em propaganda. Sem elas, não há como pagar salários, comprar papel e todas as outras despesas inerentes ao processo. Os clientes não podem ser contrariados.
Por isso precisamos relembrar a história. No Brasil já existiu uma imprensa de qualidade, embora, a ditadura militar e os governos subsequentes fizeram questão de falir. Sem medo de ser feliz, posso contar a minha experiência, ou parte dela para não me tornar cansativo.
Durante o rigor da ditadura militar, em meados de outubro de 1969 a Tribuna da Bahia foi definitivamente para as ruas, uma sensação jornalística por vários motivos, inclusive por ser o primeiro jornal impresso em OFSETE. Transformou-se num marco político e de compreensão ideológica muito grande para mim.
Nessa época, o jornal que representava a esquerda na Bahia, era o Jornal da Bahia que sofria com o bloqueio econômico imposto pela ditadura e do governo do estado da Bahia, na época o famigerado Antonio Carlos Magalhães, já falecido (ACM).
Até hoje eu ainda não posso definir a postura ideológica do homem que fundou a Tribuna da Bahia Um empresário que nada sabia de jornal, mas possuía uma visão justa. Ele foi corajoso, isso ninguém poderia negar. Contratou como Editor Chefe, o melhor que poderia ser localizado no mercado. Quintino de Carvalho, um jornalista idealista, declaradamente de esquerda, torturado e quase morto por Getúlio Vargas, vindo do Jornal do Brasil no Rio de Janeiro. Ele implantou na Bahia a imprensa democrática e ideológica.
Sendo eu um jovem com 17 anos, cheio de adrenalina me impulsionando para o combata ao regime militar, trabalhar como repórter na Tribuna da Bahia me ensinou a ter a visão ampliada para suportar as diferenças ideológicas. Ali, encontrei um celeiro de ideias revolucionárias e ao mesmo tempo outras mais contidas e até mesmo burguesas, embora, nunca reacionárias.
Para que todos os que não viveram essas experiências possam entender melhor as situações que vou narrar, me sinto obrigado ao esclarecimento do que aquele momento significava para a imprensa e para nós, os militantes Socialista ou Comunista.
Em todo o Brasil, a ditadura Militar começava a matar com mais frequência os militantes, ou supostos militantes, de esquerda. A tortura como método de eliminação, estava penetrando no seu grande momento, no auge. Era o terror legalizado pelo governo inconveniente da Ditadura Militar.
Muitos que foram presos, torturados ou mortos, nunca nem passaram por perto de um compromisso ideológico. Alguns nem sabiam o motivo de tudo aquilo. Sem saber, os Militares estavam criando alguns heróis que apenas acreditavam na liberdade de pensamentos, queriam ser honestos ou até mesmo estavam no local errado, na hora errada ou conheciam pessoas erradas.
Alguns militares, ignorantes e violentos, pareciam ansiar e até mesmo sofrer com a necessidade de se tornarem vilões históricos. Inventavam inimigos. Para que sejamos justos, frisamos que havia militares de esquerda e outros que apenas se mantinham quietos por conta de uma disciplina interna.
A imprensa foi amordaçada, na Bahia e no Brasil, nem foi necessário muito esforço, os jornais era todos favoráveis ao Regime Militar. A Tribuna da Bahia e o Jornal da Bahia, de maneira inesperada e surpreendente, foram vozes discordantes. Sofreram, mas resistiram.
Atualmente não possuímos mais nenhum jornal ou emissora de TV, ou rádio, que seja livre do domínio oligárquico da direita. As concessões foram distribuídas, e continuam assim, nas mãos dos velhos e conhecidos “coronés”. Mas vale a pena saber que um dia tudo foi diferente. Por isso, somos obrigados a amargar a manipulação das informações de maneira covarde impetrada pela elite que não gosta que o povo pense por conta própria.
Entre os inúmeros episódios que presenciei trabalhando na Tribuna da Bahia, cito um que foi para mim um símbolo do autoritarismo e crueldade dessa mesma direita que hoje está no poder depois do Golpe de Estado de 2016.
O Editor Chefe, Quintino, me pediu para ser cobertura na fuga de um casal de jornalistas. Eles não poderiam mais ficar em Salvador ou seriam presos e mortos pela policia federal. Estavam precisando da ajuda de uma pessoa que não despertasse suspeitas e eu seria perfeito. Com cara de menino, sem qualquer envolvimento político aparente, passaria fácil pelos olheiros.
- Eles sabem para onde você deve levá-los! - Disse Quintino com ar preocupado. – Não tente fazer mais do que isso! – ele bateu em meu ombro e sorriu. – Já é muito!
Eu me sentia um verdadeiro guerrilheiro ajudando na fuga desse casal.
Uma semana depois, soubemos que o jornalista que trabalhava no Jornal da Bahia, um paulista muito culto e preparado, havia sido preso no meio da rua ainda em Salvador. Sua mulher, outra jornalista, também havia sido presa, torturada e solta. Ela estava grávida e sofrera muito nos dois dias de agonia que viveu na Policia Federal. Soube dos detalhes depois, eu a conhecia muito bem.
O marido desaparecera. Na policia fingiam que ele nem existia. Com a intromissão de Quintino, ela ficou sabendo que ele havia sido levado para Recife. Foram mais de cinco anos de angustia até ter certeza do paradeiro dele e receber um atestado de óbito. Ele foi um dos presos jogados de um avião em alto mar.

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